NA IMPRENSA NACIONAL - Valor Econômico
Data: 05/08/2010-08-05
Jornal: Valor Econômico
Caderno: Finanças
Adriana Cotias, de São Paulo
Cartão regional quer ser nacional
Com Cielo e Redecard, cartões regionais cruzam fronteiras e tornam-se nacionais
Longe da briga entre Visa e MasterCard para ganhar a preferência do consumidor, são as pequenas bandeiras com atuação regional que começam a travar um embate paralelo no mercado de cartões. Antes restritas ao segmento ou estado onde se originaram, agora aspiram avançar pelo território brasileiro.
O pontapé para vencer as barreiras geográficas veio com parcerias fechadas com as grandes redes de credenciamento de lojistas e captura de transações, Redecard e Cielo, que podem colocar no mapa nacional nomes como Sorocred, Coopercred e Cabal ao lado da já grande Hipercard ou da Tricard, do Grupo Martins. A próxima da lista promete ser a Banescard, do Banco do Estado do Espírito Santo (Banestes), que conversa com as duas principais adquirentes e pretende abrir uma licitação ainda neste mês, segundo o presidente Roberto da Cunha Penedo.
Além das internacionais dominantes, o país conta com cerca de 90 bandeiras, que devem movimentar neste ano mais de R$ 30 bilhões, segundo estimativas da Boanerges & Cia, consultoria em varejo financeiro, o que deve representar pouco mais de 5% do volume de transações do setor, de R$ 534 bilhões em 2010, pelas projeções da Abecs. Antes da abertura do mercado de cartões, eram marcas predestinadas a ser pequenas ou teriam de lançar mão de recursos vultosos para ter uma distribuição mais abrangente. Mas a partir da quebra da exclusividade da Cielo com a Visa e do fim do acordo de cavalheiros entre Redecard e MasterCard, o Brasil passou a ser o limite.
O primeiro a puxar a fila foi o cartão Hipercard, que nasceu na rede de supermercados Bompreço (vendido para o Walmart) e que hoje pertence ao Itaú Unibanco. A bandeira fez história no Nordeste, tem uma base de 13,5 milhões de plásticos e ganhou presença no Sul do país com as aquisições da franquia americana na região. Em maio, a Hipercard fechou acordo com a Redecard ambicionando ser uma marca verdadeiramente nacional, caminho depois seguido pelas menores.
Com uma base de 3,5 milhões de cartões, a paulista Sorocred selou acordo tanto com a Redecard quanto com a Cielo para não ficar na mão caso o lojista se decida por uma ou outra rede. Numa tacada só partiu de uma malha de 150 mil estabelecimentos credenciados para 1,7 milhão. Em dois anos, a meta é triplicar a quantidade de transações, hoje na casa do R$ 1,2 bilhão, e chegar a um total de 5 milhões de plásticos, segundo o presidente Nilton Ferreira da Silva. "Tínhamos 85% da operação concentrada em São Paulo e a partir de agora deixamos de ser regional, nossa preocupação com rede acaba e podemos pensar só em captar novos clientes e emitir plásticos."
Com um volume de transações previsto em R$ 230 milhões em 2010, a paranaense Coopercred, que nasceu dentro rede de supermercados São Francisco, de Maringá, traça seu plano estratégico para 2011 com base na parceria fechada com a Redecard. Nessa conta considera os mais de 1 milhão de estabelecimentos credenciados pela empresa, que contrasta com os cerca de 8 mil atuais e começa a vislumbrar números na casa dos R$ 500 milhões, segundo o diretor Pedro Pereira. "Ao nos aliarmos a uma grande rede, ganhamos velocidade na expansão dos negócios e, ao mesmo tempo, vencemos a barreira com o lojista, que tinha que colocar mais um POS (o terminal de captura) no balcão."
Já a Cabal, de origem argentina e aqui ligada ao Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob), quer ser uma bandeira aberta a novos emissores e, por isso, a parceria com a Redecard, conta Marcos Vinícius Viana Borges, superintendente geral da marca. A intenção é replicar no Brasil a mesma trajetória trilhada na Argentina. Também lá a bandeira nasceu dentro do Banco Credicoop na década de 1980, abriu a emissão e hoje tem presença entre os 15 maiores emissores bancários do país, ficando atrás apenas das grandes internacionais. "A adquirência aberta permite o surgimento de novas bandeiras como a elo, e também o desenvolvimento das regionais que patinavam por falta de rede."
Já o Banestes quer antes de qualquer outra coisa defender o seu mercado no Espírito Santo.
Dentre as bandeiras que se integraram recentemente às grandes redes de credenciamento, Redecard e Cielo, o que há em comum é que são marcas estabelecidas entre as classes menos favorecidas da população, segmento que a nova bandeira elo, do Bradesco com o Banco do Brasil, promete disputar. É o mesmo nicho trabalhado pela já grande Hipercard, do Itaú Unibanco.
Como trunfo para competir com gigantes, as marcas regionais apresentam uma política mais flexível de aprovação de crédito e de parcerias com os estabelecimentos comerciais no desenho de cartões "private label" (com a marca do lojista) ou de cartões benefício.
Coincidentemente, no 1º de julho, data que marcou a abertura oficial do mercado de cartões, a Sorocred ganhou aval do Banco Central (BC) para transformar a administradora de cartões numa financeira. Com uma prateleira mais completa, vai poder agregar à oferta de "private label" e plásticos embandeirados linhas como o crédito consignado e o financiamento de veículos. O intuito é continuar chegando ao contingente não bancarizado, os estratos das classes "C-" e "D" da população, em que se especializou nos seus 30 anos de atuação. A ideia é, primeiro, incrementar a operação nos Estados onde já tem alguma presença, como Paraná, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro e Minas Gerais, além do Distrito Federal.
A emissão, tal como é feita hoje, caberá aos lojistas parceiros e, na abordagem, não há exigência de renda mínima. Muitas vezes, os ganhos mensais, sobretudo de trabalhadores informais, se limitam a R$ 150, R$ 200, conta Nilton Ferreira da Silva, presidente da Sorocred. "Os bancos até dividem parte da classe C conosco, mas entram com um 'score' (pontuação de risco de crédito) mais travado." Conforme exemplifica, enquanto algumas instituições aprovam cerca de 30% das propostas, a Sorocred tem um índice entre 40% e 70%, dependendo da região.
A paranaense Coopercred pretende costurar parcerias com associações comerciais, sindicatos e empresas para apresentar não só o "private label", como também os cartões de refeição, alimentação e multibenefícios, conta o diretor Pedro Pereira. Para tanto, está reestruturando a área comercial, agregando mais 30 profissionais ao quadro atual de 90 pessoas, para avançar em cidades do Sul, Sudeste e Centro-Oeste. "Existem praças jamais procuradas pelas grandes bandeiras e nós temos flexibilidade de taxas, vamos entrar com produtos mais baratos." Conforme exemplifica, numa parceria recentemente fechada em Pato Branco, a comissão do "voucher" alimentação será metade da cobrada por outras bandeiras, que mordem uma fatia de 6% a 7% por transação.
Antes de fechar com a Redecard, a Coopercred chegou a procurar Cielo e GetNet, mas as conversações não evoluíram. A primeira não teria se interessado pelo porte da bandeira, mantendo o foco estratégico nos grandes negócios, enquanto a GetNet estava às voltas com o Santander para costurar a parceria no ramo de adquirência. Segundo Pereira, a lógica por trás do acordo com uma grande rede está nos custos. "Os investimentos para usar os nossos próprios equipamentos de captura são muito elevados e a negociação com o lojista também não é simples, ele não quer colocar mais um POS no balcão."
Agora quem bate às portas de Cielo e Redecard é o Banestes, com a Banescard. Criada há dois anos, a marca conta com uma base de cerca de 800 mil cartões, que acumulam a função débito e crédito e são aceitos em mais de 21,5 mil estabelecimentos. Mais do que ser uma bandeira nacional, a ideia é que a aceitação seja amplificada, conta o presidente do banco, Roberto Penedo. "Não temos a ambição de emitir em localidades onde não temos agência, mas queremos garantir o mercado dentro do Estado." O modelo que está propondo é manter a própria rede no Espírito Santo e usar o terceiro fora dali. No segundo semestre, a intenção é também começar a converter a base para cartões com chip e incluir um programa de fidelidade, iniciativas que podem ampliar a base ativa, hoje restrita a 300 mil plásticos.
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