20/11/2023 11h25

Orquestra Brasileira de Cantores Cegos leva ao palco a diversidade da tradição oral de norte a sul do país

A Orquestra Brasileira de Cantores Cegos é formada por 16 pessoas (Fotos: Cia Poéticas da Cena Contemporânea)

Nos próximos dias 23 e 24, a Orquestra Brasileira de Cantores Cegos se apresenta no Sesc Glória, Centro de Vitória, com um repertório formado por 15 canções da tradição oral de várias partes do país e inéditas para o público em geral. A entrada é gratuita e a organização do evento distribuirá os ingressos uma hora antes do espetáculo, que começará às 19h30.

Diretora cênica do espetáculo, Rejane Arruda considera que o trabalho com pessoas com deficiência é enriquecedor. Além disso, ressalta que a diversidade potencializa os produtos estéticos por vários motivos, como a habilidade com o som e a voz e o repertório de vida que se construiu nessa experiência com a deficiência.

“Há toda a relação com o som, porque é assim que o mundo se revela para eles. Então, é óbvio que há uma relação muito forte com a música e com a voz. E a questão da estética também está sempre posta. Os trabalhos artísticos realizados com pessoas com deficiência mostram como uma especificidade traz uma nova estética e é um trampolim para novas descobertas artísticas”, observa a diretora.

A expectativa para as apresentações é grande. O participante da orquestra Adair Jervaz, que sempre gostou de música, pôde aprender cavaquinho e violão, e agora está há sete anos fazendo aula de teclado. “Me sinto muito feliz por fazer parte desse coletivo. É muito gratificante. Temos um grupo muito qualificado em que todos se ajudam. Tem sido uma experiência muito marcante para mim e é algo que vou guardar para sempre no meu coração”, diz.

Outro participante, Maycon Machado descobriu durante os ensaios o seu potencial para cantar. Ele faz a voz de barítono – timbre médio masculino, em um coral, mais grave que o tenor e mais agudo que o baixo. “Tem sido uma experiência maravilhosa. Pude conhecer bastante dessas músicas da tradição oral, antes desconhecidas por mim. Também tenho aprendido muitas coisas que geralmente não temos contato na escola, como sobre canções de trabalho e cultura indígena, por exemplo”, pontua.

Ao todo, foram selecionadas 16 pessoas com deficiência visual para fazer parte do grupo que apresentará as músicas do repertório. Todas recebem uma bolsa de R$ 400 por mês, durante os seis meses de projeto.

O responsável pela seleção das vozes foi o professor da Faculdade de Música do Espírito Santo (Fames) Thomas Davison, que é maestro, regente e cantor. Desde o mês de junho, os escolhidos para compor o elenco participam dos ensaios e da preparação técnica para o espetáculo. Para Davison, um dos grandes desafios desse projeto é reger os cantores sem ser visto por eles. 

“Sou maestro há alguns anos, mas neste caso precisei ressignificar todos os conceitos de regência aplicados até então. Passamos um período de conhecimento mútuo e foi nas tentativas e acertos que conseguimos criar uma conexão ímpar que hoje me faz estar totalmente ligados a eles. Sou como os seus olhos, sou a partitura que eles precisam ler. Porém, são os sons que produzo (com o corpo e as mãos) e minha voz que os regem. E isso tudo se tornou meio que mágico. É como se eles literalmente pudessem me ver, me perceber”, conta o maestro.

A Orquestra Brasileira de Cantores Cegos é uma iniciativa da Associação Sociedade Cultura e Arte (Soca Brasil) e da Cia Poéticas da Cena Contemporânea, com patrocínio da ES Gás, viabilizado por meio da Lei de Incentivo à Cultura Capixaba (LICC), da Secretaria da Cultura (Secult).

Repertório

O espetáculo terá, ao todo, 15 canções com arranjos de vozes acompanhadas do som de um piano. A diversidade cultural brasileira está marcada no repertório construído a partir da pesquisa de campo realizada por Renata Mattar, que percorre o país inteiro registrando cantigas ancestrais.

Segundo ela, escolher as músicas para o projeto foi um dos desafios mais importantes que já teve. “Nos meses de pesquisa e de seleção das 15 cantigas, só pude pensar em escolher as mais belas melodias, mas também, cantigas que além de belas criassem conexões com os cantores, que fizessem sentido para eles.”

O repertório é inédito em apresentações e conta com canções de domínio público colhidas de norte a sul do Brasil, transmitidas de geração em geração e que acompanham atividades como o trabalho, as brincadeiras, o ninar e os festejos.

Apesar de o acervo da pesquisadora ter começado a ser construído em 1999, o trabalho realizado para a orquestra também dependeu de viagens específicas para buscar novas cantigas, quando pode registrar memórias de cantos indígenas, cantos de pescadores e outros que ainda não faziam parte do meu repertório.

“Pensei logo em um caminho para me guiar que foi o dos cantos de trabalho, com a certeza de que esse repertório reverbera no corpo, na voz, criando imagens, trazendo memórias ancestrais, encontrando significados dentro de cada um”, explica Renata Mattar.

Espetáculo

A encenadora, atriz e cineasta Rejane Arruda assume a direção cênica, com André Stefson responsável pela iluminação e Antonio Apolinário pela direção de arte. Os arranjos de voz e piano ficam por conta da cantora e musicista Tarita de Souza.

Para o espetáculo, será preparada a combinação do arranjo vocal com composições corporais executadas por atores da Cia Poéticas da Cena Contemporânea. 

O Sesc Glória será o palco das três apresentações, que têm entrada gratuita. Uma delas, no dia 24, às 14h30, é destinada a alunos da rede pública do ensino fundamental. Na estreia, além do público em geral, haverá também a participação na plateia de alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA), com oferta de ônibus para o transporte até o local do evento.

Serviço:

Orquestra Brasileira de Cantores Cegos

Quando: 23 e 24 de novembro

Horário: às 19h30

Local: Sesc Glória, Av. Jerônimo Monteiro, 428, Centro de Vitória

Entrada gratuita (ingressos distribuídos gratuitamente uma hora antes)

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